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quinta-feira, 3 de dezembro de 2009
Deus é POP - Revista Época - Nelito Fernandes
Com mais de 20 tatuagens estampadas no corpo, dois piercings no nariz e um alargador de orelha, a paulistana Fernanda Soares Mariana, de 19 anos, parece estar montada para um show de rock. Apenas a Bíblia que ela carrega nos braços sugere outro destino. E Fernanda, a despeito do visual, está pronta mesmo é para encontrar Jesus. “A igreja não pode julgar. Ela tem de estar lá para transformar sua vida, e não sua aparência”, afirma. A igreja que Fernanda escolheu não a julga pelo figurino. Numa noite de domingo, no templo da Bola de Neve Church do Rio de Janeiro, o que se vê são fiéis vestindo bermudas e camisetas com estampas de surfe. Boa parte exibe tatuagens como as de Fernanda. No altar, uma banda toca música gospel, enquanto a vocalista grita o refrão “Jesus é meu Senhor, sem Ele nada sou”. Na plateia, cerca de 300 pessoas acompanham o show em catarse, balançando fervorosamente ao som da música. A diaconisa Julia Braz, de 18 anos, sobe ao palco de cabelo escovado e roupa fashion. Põe a Bíblia sobre uma prancha de surfe no púlpito e anuncia: “O evangelismo tá bombando!”. Amém. Cultos voltados para os jovens, como a igreja da Bola de Neve, revelam um fenômeno: mostram que o jovem brasileiro busca formas inovadoras de expressar sua religiosidade. Em 1882, o filósofo alemão Friedrich Nietzsche assinou a certidão de óbito divina com a célebre afirmativa: “Deus está morto”. Para ele, os homens não precisariam mais viver a ilusão do sobrenatural. Nietzsche não foi o único. O anacronismo da fé religiosa era uma premissa do socialismo. “A religião é o ópio do povo” está entre as frases mais conhecidas de Karl Marx. Para Sigmund Freud, a necessidade que o homem tem de religião decorreria de incapacidade de conceber um mundo sem pais – daí a invenção de um Deus. A influência de Marx e de Freud no pensamento do século XX afastou gerações de jovens da fé. Mas a derrocada do socialismo e as críticas à psicanálise freudiana parecem ter deixado espaço para a religiosidade se manifestar, sobretudo entre os jovens. “Aquilo que muitos acreditavam que destruiria a religião – a tecnologia, a ciência, a democracia, a razão e os mercados –, tudo isso está se combinando para fazê-la ficar mais forte”, escreveram John Micklethwait e Adrian Wooldridge, ambos jornalistas da revista britânica The Economist, no livro God is back. Para os jovens, como diz o título do livro, Deus está de volta. Ou, nas palavras da diaconisa Julia, “está bombando”. Uma pesquisa feita por um instituto alemão mostra que 95% dos brasileiros entre 18 e 29 anos se dizem religiosos e 65% afirmam ser “profundamente religiosos” Uma pesquisa inédita do instituto alemão Bertelsmann Stifung, realizada em 21 países, revela que esse renascimento da religião está mais presente no Brasil que na maioria dos países. O estudo mostra que o jovem brasileiro é o terceiro mais religioso do mundo, atrás apenas dos nigerianos e dos guatemaltecos. Segundo a pesquisa, 95% dos brasileiros entre 18 e 29 anos se dizem religiosos e 65% afirmam que são “profundamente religiosos”. Noventa por cento afirmam acreditar em Deus. Milhões de jovens recorrem à internet para resolver seus problemas espirituais. Na rede de computadores, a diversidade de crenças se propaga como vírus. “Na minha geração só sabia o que era budismo quem viajava para o exterior”, diz a antropóloga Regina Novaes, da Universidade de São Paulo e ex-presidente do Conselho Nacional de Juventude. “Hoje, com a internet, o jovem conversa com todo o mundo e conhece novas religiões. A internet virou um templo.” Mais talvez do que isso, ela se converteu no veículo ideal de uma religião contemporânea e desregulada, que pode ser exercida coletivamente sem sair de casa e sem submeter-se a qualquer disciplina. Até o século XIX, o Brasil tinha uma religião oficial: a católica. Quem não era católico não podia trabalhar para o Estado. Os outros cultos eram permitidos, mas desde que não fossem praticados dentro de edificações cuja arquitetura lembrasse uma igreja. Hoje, quase metade dos jovens brasileiros diz professar outras religiões – e essa talvez seja uma das características mais marcantes da nova religiosidade do jovem brasileiro. “É um salto muito grande, em muito pouco tempo”, diz o antropólogo Roberto DaMatta. Parte da explicação para a transformação de uma sociedade baseada numa só fé para a era das múltiplas escolhas está na disposição do jovem para experimentar. Ele pode aderir a seitas exóticas, viver aquele momento e depois voltar para a tradição sem grandes dilemas. “O jovem não decide ser católico só para seguir a religião dos pais. Ele quer distância disso”, diz o teólogo Rubem Alves. A experiência de Alves com jovens mostra que eles querem seguir os próprios caminhos. Os jovens, diz ele, adotam religiões minoritárias por achar que estão vivendo uma grande missão: querem mostrar ao mundo que, apesar da pouca idade, já encontraram sua “verdade”. Seria quase um ato de afirmação juvenil. Na religião, como na política e nos costumes, há rebeldia. Assim como os pais religiosos já não transmitem sua crença aos filhos, os pais ateus também não influenciam os filhos a adotar o ateísmo. Uma pesquisa feita com famílias do Rio de Janeiro revela que 60% dos filhos de pais ateus acreditam em Deus e adotam alguma religião. Alguns, motivados por questões íntimas, empreendem verdadeiras peregrinações em busca de respostas a suas inquietações. Texto Completo: http://extestemunhasdejeova.net/forum/viewtopic.php?f=21&t=2308
quarta-feira, 2 de dezembro de 2009
O mercado do cristianismo - Por Márcio Salgues
Domingo é dia de marketing e proselitismo. Só em uma avenida próxima de onde moro há doze igrejas, entre católicas e evangélicas nas suas mais diversas ramificações, eu mesmo contei. Em outra das maiores avenidas do Recife há uma quantidade ainda maior de templos cristãos.
As faixas de pedestres se tornaram num palco ao ar livre a cada sinal vermelho, onde crianças carentes que fazem malabarismos com pedaços de cabos de vassouras - as mais experientes acendem as pontas desses paus fazendo as manobras com tochas - disputam espaço com religiosos imbuídos da tarefa de propagar o cristianismo. Em vários semáforos, duas pessoas estendem faixas com versículos bíblicos ou mensagens apocalípticas diante dos carros parados, enquanto o restante do grupelho segue distribuindo folhetos entre os motoristas e pessoas às janelas dos ônibus.O que não deixa de ser curioso sob a própria ótica cristã... Enquanto uns pedem comida, outros distribuem panfletos e lançam palavras ao vento, deixando de enxergar os mais necessitados bem ali ao seu lado.
A idéia básica é que todos pregam a mesma coisa: a salvação por meio de Jesus Cristo. Mas a prática mostra justamente, que predominam, em qualquer situação, as mesmas regras do neoliberalismo e da livre concorrência de mercado - no caso, o mercado de almas e contribuintes em potencial. Para tanto, qualquer diferencial é válido a fim de maximizar os benefícios oferecidos e minimizar as deficiências. Afinal, para que tantas denominações diferentes a poucos metros de distância se todos pregam a mesma coisa e tem o mesmo objetivo teoricamente?
Em um certo ponto existem três igrejas diferentes vizinhas. O "cliente-alma perdida" passa na frente, verifica as ofertas que variam de "loja" para "loja" - da simples hóstia aos mais mirabolantes milagres - é convidado a entrar, como numa grande feira livre, e seduzido - quando não induzido - a filiar-se àquela instituição. Algo como você entrar numa loja e o vendedor tentar lhe vender o produto a todo custo.
O mundo seria muito melhor se não houvessem surgido as tantas religiões, clamando ser portadoras da verdade, que temos hoje, e fosse regido tão somente pela razão e por uma ética universal. É lógico que isso é um delírio assim como a "Utopia" de Thomas Morus, pois o homem se diversifica culturalmente de forma constante. No livro "Deus e os homens", Voltaire, um dos maiores expoentes do iluminismo francês, nos diz que não houve idéia melhor que pudesse por um freio aos homens a fim de julgar seus sentimentos mais ocultos, do que a idéia de um deus que pune ou recompensa a cada indivíduo conforme seus atos.
As faixas de pedestres se tornaram num palco ao ar livre a cada sinal vermelho, onde crianças carentes que fazem malabarismos com pedaços de cabos de vassouras - as mais experientes acendem as pontas desses paus fazendo as manobras com tochas - disputam espaço com religiosos imbuídos da tarefa de propagar o cristianismo. Em vários semáforos, duas pessoas estendem faixas com versículos bíblicos ou mensagens apocalípticas diante dos carros parados, enquanto o restante do grupelho segue distribuindo folhetos entre os motoristas e pessoas às janelas dos ônibus.O que não deixa de ser curioso sob a própria ótica cristã... Enquanto uns pedem comida, outros distribuem panfletos e lançam palavras ao vento, deixando de enxergar os mais necessitados bem ali ao seu lado.
A idéia básica é que todos pregam a mesma coisa: a salvação por meio de Jesus Cristo. Mas a prática mostra justamente, que predominam, em qualquer situação, as mesmas regras do neoliberalismo e da livre concorrência de mercado - no caso, o mercado de almas e contribuintes em potencial. Para tanto, qualquer diferencial é válido a fim de maximizar os benefícios oferecidos e minimizar as deficiências. Afinal, para que tantas denominações diferentes a poucos metros de distância se todos pregam a mesma coisa e tem o mesmo objetivo teoricamente?
Em um certo ponto existem três igrejas diferentes vizinhas. O "cliente-alma perdida" passa na frente, verifica as ofertas que variam de "loja" para "loja" - da simples hóstia aos mais mirabolantes milagres - é convidado a entrar, como numa grande feira livre, e seduzido - quando não induzido - a filiar-se àquela instituição. Algo como você entrar numa loja e o vendedor tentar lhe vender o produto a todo custo.
O mundo seria muito melhor se não houvessem surgido as tantas religiões, clamando ser portadoras da verdade, que temos hoje, e fosse regido tão somente pela razão e por uma ética universal. É lógico que isso é um delírio assim como a "Utopia" de Thomas Morus, pois o homem se diversifica culturalmente de forma constante. No livro "Deus e os homens", Voltaire, um dos maiores expoentes do iluminismo francês, nos diz que não houve idéia melhor que pudesse por um freio aos homens a fim de julgar seus sentimentos mais ocultos, do que a idéia de um deus que pune ou recompensa a cada indivíduo conforme seus atos.
Religião é lucro espiritual? - Por Maurício Gomes Angelo
Nas diferentes alas em que elas se dividem e em seus respectivos mundos, encontra-se de tudo: poses sisudas, conservadorismo excessivo, teses e orientações risíveis – sexo é para reprodução, como prazer é pecado; quem se sente atraído por coisas “mundanas” (encare isso como tudo que você puder imaginar) é porque está de caso com o demônio; proibição do uso da camisinha; trajes sociais obrigatórios; em alguns casos, depilação e corte de cabelo são proibidos (imaginem as conseqüências escatológicas de tal bizarrice); maquiagem é proibida, carne de porco e café também, sangue...e daí a lista não pára – até as mais moderninhas, com decoração e apelo claramente pop, jovem e aberto a concessões, onde estão os carismáticos católicos e todas as neopentecostais.
Em vez de ser local de debates, explanação de idéias, estudo, interação, aprimoramento espiritual e prático, os fiéis e suas igrejas estabeleceram o pacto "inconsciente" da mesma se comportar e agir como uma babá, tal qual a tv, tenho minhas dúvidas sobre qual das duas é a pior.
É mais ou menos assim o contrato: “Eu aceito suas doutrinas, louvo quem você quiser, me curvo a qualquer imagem, oro para o que quer que seja, levo a sério qualquer besteira, te dou meu dinheiro, apoio e faço sua propaganda e em troca você dá um jeito de resolver qualquer problema que eu lhe apresentar e me consola em qualquer vicissitude da minha vidinha fracassada”. Legal não? Quem que comprou quem? Quem se vendeu a quem, a que? Quem está se iludindo? Mas não importa, o espetáculo do crescimento é sinal da aprovação divina, os fins sempre justificam os meios e “estaremos todos juntos no céu”. Você quer ir para esse céu?
Eu não!
Em vez de ser local de debates, explanação de idéias, estudo, interação, aprimoramento espiritual e prático, os fiéis e suas igrejas estabeleceram o pacto "inconsciente" da mesma se comportar e agir como uma babá, tal qual a tv, tenho minhas dúvidas sobre qual das duas é a pior.
É mais ou menos assim o contrato: “Eu aceito suas doutrinas, louvo quem você quiser, me curvo a qualquer imagem, oro para o que quer que seja, levo a sério qualquer besteira, te dou meu dinheiro, apoio e faço sua propaganda e em troca você dá um jeito de resolver qualquer problema que eu lhe apresentar e me consola em qualquer vicissitude da minha vidinha fracassada”. Legal não? Quem que comprou quem? Quem se vendeu a quem, a que? Quem está se iludindo? Mas não importa, o espetáculo do crescimento é sinal da aprovação divina, os fins sempre justificam os meios e “estaremos todos juntos no céu”. Você quer ir para esse céu?
Eu não!
Enfim, um ateísmo com profundidade - Por Antonio Luiz M. C. Costa
O fato de que mais pessoas assumam abertamente seu ateísmo e livros sobre o tema se tornem best-sellers tem de positivo, no mínimo, uma redução do teor de hipocrisia ambiente. Entretanto, livros como os do britânico Richard Dawkins, zoólogo e de seu compatriota Christopher Hitchens, escritor e crítico literário, não dão uma idéia muito elevada do pensamento ateu ou de sua capacidade de persuasão.
Tais obras são bem fundadas em termos de ciências naturais, mas estão demasiado desinformadas em relação à história, à filosofia e à antropologia da religião para construir uma crítica que soe pertinente a crentes inteligentes. Tais autores declaram essa categoria irrelevante, como se toda a religião se reduzisse ao fundamentalismo e bastasse refutar Adão e Eva para pôr abaixo milênios de fé e de complexas elaborações éticas e metafísicas. Um paradoxo, pois aqueles para os quais a crença literal no Gênesis ou no Alcorão é indissociável da religião são os que menos darão atenção a seus argumentos.
Essencialmente, autores como Dawkins pregam para os convertidos, para estimulá-los a “sair do armário”. Tanto para os ateus menos preocupados com a opinião alheia, quanto para os religiosos abertos ao debate e para aqueles que têm dúvidas sinceras e profundas, tais obras são rasas e pouco relevantes.
É um ponto de vista bem diferente o do filósofo francês André Comte-Sponville. Em O Espírito do Ateísmo, (Martins Fontes, 192 págs), consegue convencer o leitor de que um ateu pode ser não só inteligente e cientificamente bem-informado, como também culto, profundo e sensível.
A primeira parte do livro, “Pode-se viver sem religião?”, talvez seja a menos satisfatória. Sua resposta é que não faz diferença alguma, o que não é lá muito animador e nem sempre é totalmente crível.
Conta a história do hipotético pai que perde a fé em Deus, mas avisa aos filhos: “no que diz respeito aos valores que procurei lhes transmitir, nada se altera: conto com que vocês continuem a respeitá-los”.
Naturalmente, não é por deixar de ser crente que alguém deveria inverter todos os seus valores – muitos deles tiveram ótimas razões para serem adotados – mas, quando se acredita que a moral existe apenas como necessidade humana e não como decreto divino transcendente, é de se esperar uma atitude mais crítica e racional, a relativização ou mesmo abandono de algumas regras tradicionais e talvez também a revalorização e mesmo a invenção de outras.
Comte-Sponville admite que sua posição em relação a preservativos e homossexualidade não é a da moral cristã tradicional, mas insiste: nas “grandes questões morais”, crer ou não nada altera de essencial. Na medida em que fala por suas escolhas e convicções pessoais, nada a objetar, mas não se vê como se poderia fazer disso um princípio universal.
O filósofo francês acredita-se comprometido com os valores tradicionais do Ocidente cristão, mesmo se não com a fé cristã. Mas é escolha sua essa fidelidade à tradição e ao passado, que compara explicitamente com a piada do rabino que se tornou ateu, mas ainda assim continua com as preces rituais, pois “que tem Deus a ver com isso?” Se tivesse nascido na China, Índia ou África, admite, seu caminho seria diferente.
Mas também o leitor latino-americano pode ficar em dúvida sobre se o pensamento do filósofo lhe é aplicável. Nestas terras parte índias, parte africanas, faz pouco sentido a fidelidade exclusiva à tradição ocidental cristã, um entre outros ingredientes de um sincretismo ainda por estabelecer e consolidar, inclusive na esfera dos valores... Mas por que também um europeu não poderia, à maneira de Voltaire e Montesquieu, relativizar essa monogamia ético-histórica e aceitar ter algo a aprender com os valores de outras culturas?
A troca da “fé” pela “fidelidade” é pouco promissora, se não se distingue este segundo conceito do mero conformismo. Com ou sem fundamento, a fé no cristianismo – como o islã e no budismo, em suas respectivas esferas de influência – contrariou valores e costumes preexistentes e impôs novos, e é razoável pensar que isso nem sempre é ruim. Seria paradoxal se o ateísmo desarmasse o pensador da possibilidade de criticar em profundidade a cultura na qual se criou.
Mais interessante é o chamado de Comte-Sponville a abrir mão da esperança no sentido teológico da palavra, ou seja, de uma vida eterna e infinitamente bem-aventurada. Propõe, em seu lugar, um alegre desespero: nada é para esperar, tudo é para fazer, no que depende de nós, ou para amar, no que não depende. É o contrário do niilismo, pois os niilistas não são desesperados e sim decepcionados – e não há como se decepcionar a não se em relação a uma esperança prévia.
A segunda parte do livro trata dos argumentos relativos à existência ou inexistência de Deus. Onde Dawkins, por exemplo, limita-se a descartar os tradicionais argumentos em favor da existência de Deus em três páginas como “tolos”, sem chegar a compreendê-los, o francês os discute e refuta no plano filosófico, como deve ser.
Em seguida, passa aos argumentos do ateísmo. Nada de noções de ciência para principiantes, mas sim pontos que vão ao fundo das razões filosóficas e psicológicas da crença. Por exemplo, a existência do mal, pelo qual nem só a humanidade é responsável. A mediocridade do ser humano, que não permite fazer uma idéia muito elevada do ser supostamente onipotente que o criou. E seu próprio desejo de um Deus, que torna suspeito todo impulso religioso como confusão entre desejo e realidade.
A terceira parte é, talvez, a mais interessante. Discute espiritualidade atéia, coisa de que Dawkins reduz ao senso de maravilha ante a complexidade do Universo e Hitchens sequer cogita. Comte-Sponville reconhece a experiência mística e o sentido espiritual do confronto com o infinito, a eternidade e o absoluto, dando-lhe o seu devido lugar – não o primeiro no mundo, mas o mais elevado no ser humano. Não se trata da consideração intelectual das leis da natureza, mas de um estado de consciência particular, de um sentimento espontâneo de paz, união e pertencimento.
Experiência silenciosa, mas que pode ser descrito como suspensão da banalidade, do já conhecido, pensado e dito, deixando-nos à frente com o novo, com o singular e com o mistério que é, ao mesmo tempo, a evidência do ser. Suspensão também da carência e da cobiça, permitindo o contato com a liberdade e a plenitude. Suspensão do ego e seu discurso, abrindo à experiência da unidade, simplicidade e verdade. Colocação entre parênteses da expectativa e do medo, do passado e do futuro, para que se possa constatar a serenidade e a eternidade.
O sentimento, enfim, de que não se precisa esperar pelo Reino, pois já estamos nele. É o Pentecostes dos ateus, ou o verdadeiro espírito do ateísmo, diz o filósofo: não o Espírito que desce, mas o espírito que se abre e se regozija. Não é a verdade e o absoluto que são amor, mas o amor que, às vezes, é verdadeiro e nos abre para o absoluto.
Tais obras são bem fundadas em termos de ciências naturais, mas estão demasiado desinformadas em relação à história, à filosofia e à antropologia da religião para construir uma crítica que soe pertinente a crentes inteligentes. Tais autores declaram essa categoria irrelevante, como se toda a religião se reduzisse ao fundamentalismo e bastasse refutar Adão e Eva para pôr abaixo milênios de fé e de complexas elaborações éticas e metafísicas. Um paradoxo, pois aqueles para os quais a crença literal no Gênesis ou no Alcorão é indissociável da religião são os que menos darão atenção a seus argumentos.
Essencialmente, autores como Dawkins pregam para os convertidos, para estimulá-los a “sair do armário”. Tanto para os ateus menos preocupados com a opinião alheia, quanto para os religiosos abertos ao debate e para aqueles que têm dúvidas sinceras e profundas, tais obras são rasas e pouco relevantes.
É um ponto de vista bem diferente o do filósofo francês André Comte-Sponville. Em O Espírito do Ateísmo, (Martins Fontes, 192 págs), consegue convencer o leitor de que um ateu pode ser não só inteligente e cientificamente bem-informado, como também culto, profundo e sensível.
A primeira parte do livro, “Pode-se viver sem religião?”, talvez seja a menos satisfatória. Sua resposta é que não faz diferença alguma, o que não é lá muito animador e nem sempre é totalmente crível.
Conta a história do hipotético pai que perde a fé em Deus, mas avisa aos filhos: “no que diz respeito aos valores que procurei lhes transmitir, nada se altera: conto com que vocês continuem a respeitá-los”.
Naturalmente, não é por deixar de ser crente que alguém deveria inverter todos os seus valores – muitos deles tiveram ótimas razões para serem adotados – mas, quando se acredita que a moral existe apenas como necessidade humana e não como decreto divino transcendente, é de se esperar uma atitude mais crítica e racional, a relativização ou mesmo abandono de algumas regras tradicionais e talvez também a revalorização e mesmo a invenção de outras.
Comte-Sponville admite que sua posição em relação a preservativos e homossexualidade não é a da moral cristã tradicional, mas insiste: nas “grandes questões morais”, crer ou não nada altera de essencial. Na medida em que fala por suas escolhas e convicções pessoais, nada a objetar, mas não se vê como se poderia fazer disso um princípio universal.
O filósofo francês acredita-se comprometido com os valores tradicionais do Ocidente cristão, mesmo se não com a fé cristã. Mas é escolha sua essa fidelidade à tradição e ao passado, que compara explicitamente com a piada do rabino que se tornou ateu, mas ainda assim continua com as preces rituais, pois “que tem Deus a ver com isso?” Se tivesse nascido na China, Índia ou África, admite, seu caminho seria diferente.
Mas também o leitor latino-americano pode ficar em dúvida sobre se o pensamento do filósofo lhe é aplicável. Nestas terras parte índias, parte africanas, faz pouco sentido a fidelidade exclusiva à tradição ocidental cristã, um entre outros ingredientes de um sincretismo ainda por estabelecer e consolidar, inclusive na esfera dos valores... Mas por que também um europeu não poderia, à maneira de Voltaire e Montesquieu, relativizar essa monogamia ético-histórica e aceitar ter algo a aprender com os valores de outras culturas?
A troca da “fé” pela “fidelidade” é pouco promissora, se não se distingue este segundo conceito do mero conformismo. Com ou sem fundamento, a fé no cristianismo – como o islã e no budismo, em suas respectivas esferas de influência – contrariou valores e costumes preexistentes e impôs novos, e é razoável pensar que isso nem sempre é ruim. Seria paradoxal se o ateísmo desarmasse o pensador da possibilidade de criticar em profundidade a cultura na qual se criou.
Mais interessante é o chamado de Comte-Sponville a abrir mão da esperança no sentido teológico da palavra, ou seja, de uma vida eterna e infinitamente bem-aventurada. Propõe, em seu lugar, um alegre desespero: nada é para esperar, tudo é para fazer, no que depende de nós, ou para amar, no que não depende. É o contrário do niilismo, pois os niilistas não são desesperados e sim decepcionados – e não há como se decepcionar a não se em relação a uma esperança prévia.
A segunda parte do livro trata dos argumentos relativos à existência ou inexistência de Deus. Onde Dawkins, por exemplo, limita-se a descartar os tradicionais argumentos em favor da existência de Deus em três páginas como “tolos”, sem chegar a compreendê-los, o francês os discute e refuta no plano filosófico, como deve ser.
Em seguida, passa aos argumentos do ateísmo. Nada de noções de ciência para principiantes, mas sim pontos que vão ao fundo das razões filosóficas e psicológicas da crença. Por exemplo, a existência do mal, pelo qual nem só a humanidade é responsável. A mediocridade do ser humano, que não permite fazer uma idéia muito elevada do ser supostamente onipotente que o criou. E seu próprio desejo de um Deus, que torna suspeito todo impulso religioso como confusão entre desejo e realidade.
A terceira parte é, talvez, a mais interessante. Discute espiritualidade atéia, coisa de que Dawkins reduz ao senso de maravilha ante a complexidade do Universo e Hitchens sequer cogita. Comte-Sponville reconhece a experiência mística e o sentido espiritual do confronto com o infinito, a eternidade e o absoluto, dando-lhe o seu devido lugar – não o primeiro no mundo, mas o mais elevado no ser humano. Não se trata da consideração intelectual das leis da natureza, mas de um estado de consciência particular, de um sentimento espontâneo de paz, união e pertencimento.
Experiência silenciosa, mas que pode ser descrito como suspensão da banalidade, do já conhecido, pensado e dito, deixando-nos à frente com o novo, com o singular e com o mistério que é, ao mesmo tempo, a evidência do ser. Suspensão também da carência e da cobiça, permitindo o contato com a liberdade e a plenitude. Suspensão do ego e seu discurso, abrindo à experiência da unidade, simplicidade e verdade. Colocação entre parênteses da expectativa e do medo, do passado e do futuro, para que se possa constatar a serenidade e a eternidade.
O sentimento, enfim, de que não se precisa esperar pelo Reino, pois já estamos nele. É o Pentecostes dos ateus, ou o verdadeiro espírito do ateísmo, diz o filósofo: não o Espírito que desce, mas o espírito que se abre e se regozija. Não é a verdade e o absoluto que são amor, mas o amor que, às vezes, é verdadeiro e nos abre para o absoluto.
Alienação Coletiva - existe? - Por Janos Biro
A forma de transcendência mais condenada por Huxley é a multidão, chamada de alienação coletiva. Enquanto os governos e as igrejas condenam e regulam as drogas e o sexo vulgar, propiciam sempre que possível que dezenas, centenas ou milhares de pessoas se juntem num só lugar como uma massa indistinta. Segundo Huxley, a multidão é a forma mais rápida e simples de autotranscendência. Dentro de uma multidão é possível perder o senso de personalidade, as pessoas tendem a pensar menos em si mesmas e se tornam mais dispostas integrarem-se no grupo, mesmo que de forma negativa: seja chamando a atenção, imitando as ações dos outros, ou juntando-se a qualquer atividade que exija duas ou mais pessoas. Segundo sua análise, cada indivíduo dentro de uma multidão oferece menos defesa contra a persuasão e a manipulação, tornando-se extremamente mais influenciável do que em seu estado normal. O efeito de dividir espaço com milhares de pessoas diferentes é relativamente uma novidade para os seres humanos. O cérebro humano teve pouco tempo para se adaptar a tão extraordinário fenômeno. Ao longo da história, a concentração de grandes números de pessoas tem sido usada para atingir objetivos políticos, geralmente perniciosos, tendo como grande exemplo os discursos nazistas e fascistas. Junte-se a uma multidão alguns alteradores de consciência químicos, música rítmica em alto volume e o que você tem é um grande palco para hipnose. Um propagandista ao microfone, nestas situações, tem dez vezes mais chances de convencer o público do que falando com cada um individualmente. Um argumento fraco, ou mesmo falho, torna-se aceitável com apenas algumas repetições em público. Com cada vez menos oportunidades de desenvolver sua personalidade e menos tempo para a “solidão construtiva”, necessária no desenvolvimento de uma consciência holística, as pessoas são levadas a buscar formas baratas e rápidas de isolamento temporário, voltando-se cada vez mais para a transcendência descendente.
Conclusão: Ao trocar a metafísica da era religiosa pelo positivismo da era moderna, a sociedade não abandonou a “alienação fantasiosa” ao qual ela se entregara. Na verdade, a necessidade psíquica por “religação com algo divino” se tornou ainda maior, mas os métodos tomaram formas diferentes. Os sucedâneos de transcendência desempenham os mesmos papéis que antigamente nos rituais religiosos, com conseqüências muito mais prejudiciais que a inquisição e as cruzadas: a disseminação da ignorância, o conformismo, o controle social, e uma crescente massificação psicológica.
Conclusão: Ao trocar a metafísica da era religiosa pelo positivismo da era moderna, a sociedade não abandonou a “alienação fantasiosa” ao qual ela se entregara. Na verdade, a necessidade psíquica por “religação com algo divino” se tornou ainda maior, mas os métodos tomaram formas diferentes. Os sucedâneos de transcendência desempenham os mesmos papéis que antigamente nos rituais religiosos, com conseqüências muito mais prejudiciais que a inquisição e as cruzadas: a disseminação da ignorância, o conformismo, o controle social, e uma crescente massificação psicológica.
Barack Obama fala sobre Religião e Secularismo
"Dada a crescente diversidade das populações dos Estados Unidos, os riscos de sectarismo estão maiores do que nunca. O que quer que nós já tenhamos sido, nós não somos mais uma nação cristã. Pelo menos não somente. Nós somos também uma nação judaica, uma nação mulçumana e uma nação budista, e uma nação hindu e uma nação de descrentes.
E mesmo se nós tivéssemos apenas cristãos entre nós, se expulsássemos todos os não-cristãos dos Estados Unidos da América, o cristianismo de quem nós ensinaríamos nas escolas? Seria o de James Dobson ou o de Al Sharpton? Que passagens das Escrituras deveriam instruir nossas políticas públicas?
Deveríamos escolher o Levítico, que sugere que a escravidão é aceitável? E que comer frutos do mar é uma abominação? Ou poderíamos escolher Deuteronômio, que sugere apedrejar seu filho se ele se desviar da fé? Ou deveríamos apenas ficar com o Sermão da Montanha? Uma passagem que é tão radical que é de se duvidar que o nosso próprio Departamento de Defesa sobreviveria à sua aplicação.
Nós...
[Discurso interrompido por barulho na igreja. Não dá para discernir se são vaias ou aplausos]
Então, antes de nos empolgarmos, vamos ler as nossas Bíblias agora. As pessoas não têm lido a Bíblia.
O que me trás ao meu segundo ponto: que a democracia exige que aqueles motivados pela religião traduzam suas preocupações em valores universais, ao invés de específicos de uma religião. O que eu quero dizer com isso?
Ela [a democracia] requer que as propostas dela estejam sujeitas a discussão e sejam influenciáveis pela razão. Eu posso ser contrário ao aborto por razões religiosas, para tomar um exemplo, mas se eu pretendo aprovar uma lei abolindo a prática, eu não posso simplesmente recorrer aos ensinamentos da minha igreja, ou invocar a vontade divina; eu tenho que explicar por que o aborto viola algum princípio que é acessível a pessoas de todas as fés, incluindo aqueles sem fé alguma.
Agora, isto vai ser difícil para aqueles que acreditam na inerrância da Bíblia, como muitos evangélicos acreditam, mas em uma sociedade pluralista nós não temos escolha. A política depende das nossas habilidades de persuadir uns aos outros de objetivos comuns com base em uma realidade comum. Ela envolve negociação, a arte do que é possível.
E, em algum nível fundamental, a religião não permite negociar; é a arte do impossível. Se Deus falou, então espera-se que os seguidores vivam de acordo com os éditos de Deus, a despeito das conseqüências. Agora, basear a vida de uma pessoa em compromissos tão inegociáveis pode ser sublime, mas basear nossas decisões políticas em tais compromissos seria algo perigoso.
E se você duvida disso, deixe-me dar um exemplo. Nós todos conhecemos a história de Abraão e Isaac. Abraão foi ordenado por Deus a sacrificar seu único filho. Sem discutir ele leva Isaac montanha acima, até o topo, e o amarra ao altar. Levanta a sua faca. Prepara-se para agir... como Deus ordenara. Agora, nós sabemos que as coisas deram certo; Deus envia um anjo para interceder bem no último minuto. Abraão passa no teste de devoção de Deus.
Mas é justo dizer que se qualquer um de nós, ao sair dessa igreja, visse Abraão no telhado de um prédio levantando sua faca, nós iríamos, no mínimo, chamar a polícia. E esperaríamos que o Departamento de Serviço às Crianças e à Família tirasse a guarda de Isaac de Abraão.
[Risos]
Nós faríamos isso porque nós não ouvimos o que Abraão ouve, nós não vemos o que Abraão vê. Então, o melhor que podemos fazer é agir de acordo com aquela coisa que todos nós vemos, e que todos nós ouvimos. A jurisprudência é bom senso básico.
Então, nós temos algum trabalho para fazer aqui, mas eu tenho esperanças que nós podemos transpor o hiato que existe e superar os preconceitos que todos nós, em maior ou menor grau, trazemos a este debate. E eu tenho fé que milhões de americanos crentes querem que isso aconteça. Não importa o quão religiosos eles possam ser, ou não ser, as pessoas estão cansadas de ver a fé ser utilizada como ferramenta de ataque.
[Aplausos]
Elas não querem que a fé seja usada para diminuir ou para dividir porque no fim não é dessa forma que elas vêem a fé nas suas próprias vidas."
E mesmo se nós tivéssemos apenas cristãos entre nós, se expulsássemos todos os não-cristãos dos Estados Unidos da América, o cristianismo de quem nós ensinaríamos nas escolas? Seria o de James Dobson ou o de Al Sharpton? Que passagens das Escrituras deveriam instruir nossas políticas públicas?
Deveríamos escolher o Levítico, que sugere que a escravidão é aceitável? E que comer frutos do mar é uma abominação? Ou poderíamos escolher Deuteronômio, que sugere apedrejar seu filho se ele se desviar da fé? Ou deveríamos apenas ficar com o Sermão da Montanha? Uma passagem que é tão radical que é de se duvidar que o nosso próprio Departamento de Defesa sobreviveria à sua aplicação.
Nós...
[Discurso interrompido por barulho na igreja. Não dá para discernir se são vaias ou aplausos]
Então, antes de nos empolgarmos, vamos ler as nossas Bíblias agora. As pessoas não têm lido a Bíblia.
O que me trás ao meu segundo ponto: que a democracia exige que aqueles motivados pela religião traduzam suas preocupações em valores universais, ao invés de específicos de uma religião. O que eu quero dizer com isso?
Ela [a democracia] requer que as propostas dela estejam sujeitas a discussão e sejam influenciáveis pela razão. Eu posso ser contrário ao aborto por razões religiosas, para tomar um exemplo, mas se eu pretendo aprovar uma lei abolindo a prática, eu não posso simplesmente recorrer aos ensinamentos da minha igreja, ou invocar a vontade divina; eu tenho que explicar por que o aborto viola algum princípio que é acessível a pessoas de todas as fés, incluindo aqueles sem fé alguma.
Agora, isto vai ser difícil para aqueles que acreditam na inerrância da Bíblia, como muitos evangélicos acreditam, mas em uma sociedade pluralista nós não temos escolha. A política depende das nossas habilidades de persuadir uns aos outros de objetivos comuns com base em uma realidade comum. Ela envolve negociação, a arte do que é possível.
E, em algum nível fundamental, a religião não permite negociar; é a arte do impossível. Se Deus falou, então espera-se que os seguidores vivam de acordo com os éditos de Deus, a despeito das conseqüências. Agora, basear a vida de uma pessoa em compromissos tão inegociáveis pode ser sublime, mas basear nossas decisões políticas em tais compromissos seria algo perigoso.
E se você duvida disso, deixe-me dar um exemplo. Nós todos conhecemos a história de Abraão e Isaac. Abraão foi ordenado por Deus a sacrificar seu único filho. Sem discutir ele leva Isaac montanha acima, até o topo, e o amarra ao altar. Levanta a sua faca. Prepara-se para agir... como Deus ordenara. Agora, nós sabemos que as coisas deram certo; Deus envia um anjo para interceder bem no último minuto. Abraão passa no teste de devoção de Deus.
Mas é justo dizer que se qualquer um de nós, ao sair dessa igreja, visse Abraão no telhado de um prédio levantando sua faca, nós iríamos, no mínimo, chamar a polícia. E esperaríamos que o Departamento de Serviço às Crianças e à Família tirasse a guarda de Isaac de Abraão.
[Risos]
Nós faríamos isso porque nós não ouvimos o que Abraão ouve, nós não vemos o que Abraão vê. Então, o melhor que podemos fazer é agir de acordo com aquela coisa que todos nós vemos, e que todos nós ouvimos. A jurisprudência é bom senso básico.
Então, nós temos algum trabalho para fazer aqui, mas eu tenho esperanças que nós podemos transpor o hiato que existe e superar os preconceitos que todos nós, em maior ou menor grau, trazemos a este debate. E eu tenho fé que milhões de americanos crentes querem que isso aconteça. Não importa o quão religiosos eles possam ser, ou não ser, as pessoas estão cansadas de ver a fé ser utilizada como ferramenta de ataque.
[Aplausos]
Elas não querem que a fé seja usada para diminuir ou para dividir porque no fim não é dessa forma que elas vêem a fé nas suas próprias vidas."
sábado, 8 de agosto de 2009
Como eu não me importei com ninguém - Bertolt Brecht
Primeiro levaram os negros
Mas não me importei com isso
Eu não era negro
Em seguida levaram alguns operários
Mas não me importei com isso
Eu também não era operário
Depois prenderam os miseráveis
Mas não me importei com isso
Porque eu não sou miserável
Depois agarraram uns desempregados
Mas como tenho meu emprego
Também não me importei
Agora estão me levando
Mas já é tarde.
Como eu não me importei com ninguém
Ninguém se importa comigo.
domingo, 26 de julho de 2009
Entrevista com Michel Onfray
Sobram razões para Michel Onfray ser um dos filósofos mais polêmicos e mais lidos da França: contra a religião e a ideia de Deus, as instituições de ensino e a formatação de alunos para que sirvam ao mercado de trabalho, o casamento, a monogamia, a procriação, Onfray não teme enfrentar mecanismos sociais já há muito tempo estabelecidos, propondo em sua obra “novas possibilidades de existência”. Ele é herdeiro de filósofos gregos como Diógenes e Epicuro, mas também dos iluministas franceses, de Nietzsche e de Freud. Apoiando-se sobretudo nos princípios da razão e do hedonismo, Onfray acredita que devemos buscar constantemente o prazer, a liberdade e a independência, desde que, para isso, não façamos mal ao outro. A busca por essa trajetória individual, na medida de nossos desejos, é a base de toda sua extensa obra: o filósofo francês já publicou mais de 40 livros traduzidos em mais de 20 línguas com temas tão variados como religião, política, estética, relacionamentos, história da filosofia, e até mesmo gastronomia e viagens. Dentre seus livros, destacam-se Tratado de AteologiaTeoria do Corpo Amoroso e Contra-História da Filosofia.,
Onfray, além disso, fundou em 2002 a Universidade Popular de Caen, uma universidade gratuita, sem inscrições prévias, sem diplomas, aberta a qualquer interessado.
Uma de suas obras mais importantes e polêmicas é o Tratado de Ateologia, na qual o senhor defende a substituição da religião pela filosofia. Mas, para tirar a religião da vida, é preciso necessariamente substituí-la por algo?
Na verdade, é preciso substituir o placebo, a religião, pelo medicamento, a filosofia. Em outras palavras, trocar as fábulas, as histórias infantis, os mitos, o pensamento mágico, os além-mundos, pela sabedoria, pelas Luzes, pela inteligência, pela razão. Se antes ensinava-se como verdade uma Virgem que tem filhos, um Deus que abre o mar para deixar seu povo passar, mortos que ressuscitam, peixes multiplicados ao infinito, água que se transforma em vinho em um passe de mágica, hoje é preciso ensinar a reflexão, a análise, o princípio da não-contradição, a obrigação de ser coerente, o pensamento racional, sensato e reflexivo. Em resumo: substituir Bento XVI por Voltaire.
Mas qualquer um pode esquecer Deus? Mesmo aqueles que talvez não tenham conhecimento o suficiente para ver o mundo de outra maneira?
Se deixarmos uma criança longe de influências, jamais ela inventará essas bobagens, que são um puro produto da educação. É preciso somente substituir um mundo por outro, uma pedagogia por outra, um saber e seus conteúdos por outros saberes e outros conteúdos.
Entrevista completa nesse link:
http://vidasimples.abril.com.br/edicoes/082/conversa/conteudo_485844.shtml
Onfray, além disso, fundou em 2002 a Universidade Popular de Caen, uma universidade gratuita, sem inscrições prévias, sem diplomas, aberta a qualquer interessado.
Uma de suas obras mais importantes e polêmicas é o Tratado de Ateologia, na qual o senhor defende a substituição da religião pela filosofia. Mas, para tirar a religião da vida, é preciso necessariamente substituí-la por algo?
Na verdade, é preciso substituir o placebo, a religião, pelo medicamento, a filosofia. Em outras palavras, trocar as fábulas, as histórias infantis, os mitos, o pensamento mágico, os além-mundos, pela sabedoria, pelas Luzes, pela inteligência, pela razão. Se antes ensinava-se como verdade uma Virgem que tem filhos, um Deus que abre o mar para deixar seu povo passar, mortos que ressuscitam, peixes multiplicados ao infinito, água que se transforma em vinho em um passe de mágica, hoje é preciso ensinar a reflexão, a análise, o princípio da não-contradição, a obrigação de ser coerente, o pensamento racional, sensato e reflexivo. Em resumo: substituir Bento XVI por Voltaire.
Mas qualquer um pode esquecer Deus? Mesmo aqueles que talvez não tenham conhecimento o suficiente para ver o mundo de outra maneira?
Se deixarmos uma criança longe de influências, jamais ela inventará essas bobagens, que são um puro produto da educação. É preciso somente substituir um mundo por outro, uma pedagogia por outra, um saber e seus conteúdos por outros saberes e outros conteúdos.
Entrevista completa nesse link:
sexta-feira, 24 de julho de 2009
Aperitivos Teológicos - Rubem Alves
Parábola sobre Deus: Algumas pessoas olham através da vidraça, discutem sobre uma casa que estão vendo, ao longe. Uma das pessoas diz que aquela casa é habitada por um nobre, de hábitos aristocráticos e conservadores. Uma outra diz o contrário, que lá mora um operário, membro do sindicato, revolucionário. Uma terceira diz que os dois primeiros estão errados: ninguém mora na casa. Ela está vazia. Pedem a minha opinião. Eu me aproximo, eles apontam através do vidro, na direção da casa. Olho, olho, e concluo que alguma coisa deve estar errada com os meus olhos. Eu não vejo casa alguma. O que eu vejo são os reflexos do meu próprio rosto, nos vidros da vidraça...
Diz o Alberto Caeiro que pensar em Deus é desobedecer a Deus. Se Deus quisesse que pensássemos nele ele apareceria à nossa frente e diria: ‘Estou aqui!’ Mas isso nunca aconteceu. William Blake falava em ‘ver a eternidade num grão de areia...’ A eternidade se revela refletida no rio do tempo. Já tive uma paciente que achou que estava ficando louca porque viu a eternidade numa cebola cortada! Cebolas, ela já as havia cortado centenas de vezes para cozinhar. Para ela cebolas eram comestíveis. Mas, num dia como qualquer outro, ao olhar para a cebola que ela acabara de cortar, ela não viu a cebola: viu um vitral de catedral, milhares de minúsculos vidros brancos, estruturados em círculos concêntricos, onde a luz se refletia. Eu a tranqüilizei. Não estava louca. Estava poeta. Neruda escreveu sobre a cebola ‘rosa de água com escamas de cristal...’
Pessoas há que, para terem experiências místicas, fazem longas peregrinações a lugares onde anjos e seres do outro mundo aparecem. Eu, ao contrário, quando quero ter experiências místicas, vou à feira. Cebolas, tomates, pimentões, uvas, caquís e bananas me assombram mais que anjos azuis e espíritos luminosos. São entidades assombrosas. Você já olhou para elas com atenção?
Penso que Deus deve ter sido um artista brincalhão para inventar coisas tão incríveis para se comer. Penso mais: que ele foi gracioso. Deu-nos as coisas incompletas, cruas. Deixou-nos o prazer de inventar a culinária.
Místicos e poetas sabem que o Paraíso está espalhado pelo mundo - mas não conseguimos vê-lo com os olhos que temos. Somos cegos. O Zen Budismo fala da necessidade de se ‘abrir o terceiro olho’. Repentinamente a gente vê o que não via! Não se trata de ver coisas extraordinárias, anjos, aparições, espíritos, seres de um outro mundo. Trata-se de ver esse nosso mundo sob uma nova luz.
Diz o Alberto Caeiro que pensar em Deus é desobedecer a Deus. Se Deus quisesse que pensássemos nele ele apareceria à nossa frente e diria: ‘Estou aqui!’ Mas isso nunca aconteceu. William Blake falava em ‘ver a eternidade num grão de areia...’ A eternidade se revela refletida no rio do tempo. Já tive uma paciente que achou que estava ficando louca porque viu a eternidade numa cebola cortada! Cebolas, ela já as havia cortado centenas de vezes para cozinhar. Para ela cebolas eram comestíveis. Mas, num dia como qualquer outro, ao olhar para a cebola que ela acabara de cortar, ela não viu a cebola: viu um vitral de catedral, milhares de minúsculos vidros brancos, estruturados em círculos concêntricos, onde a luz se refletia. Eu a tranqüilizei. Não estava louca. Estava poeta. Neruda escreveu sobre a cebola ‘rosa de água com escamas de cristal...’
Pessoas há que, para terem experiências místicas, fazem longas peregrinações a lugares onde anjos e seres do outro mundo aparecem. Eu, ao contrário, quando quero ter experiências místicas, vou à feira. Cebolas, tomates, pimentões, uvas, caquís e bananas me assombram mais que anjos azuis e espíritos luminosos. São entidades assombrosas. Você já olhou para elas com atenção?
Penso que Deus deve ter sido um artista brincalhão para inventar coisas tão incríveis para se comer. Penso mais: que ele foi gracioso. Deu-nos as coisas incompletas, cruas. Deixou-nos o prazer de inventar a culinária.
Místicos e poetas sabem que o Paraíso está espalhado pelo mundo - mas não conseguimos vê-lo com os olhos que temos. Somos cegos. O Zen Budismo fala da necessidade de se ‘abrir o terceiro olho’. Repentinamente a gente vê o que não via! Não se trata de ver coisas extraordinárias, anjos, aparições, espíritos, seres de um outro mundo. Trata-se de ver esse nosso mundo sob uma nova luz.
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domingo, 12 de julho de 2009
O que é a Verdade?
O rei se queixava de que todos os seus súditos eram mentirosos. Então, decidiu que faria todos dizerem à verdade. Quando as portas da cidade se abriram, havia uma forca, bem à vista. O guarda anunciou: “Quem entrar na cidade, terá de responder com verdade à pergunta formulada!”
Nasrudim, um sábio, entrou. O guarda perguntou: “Aonde vai? Diga à verdade ou a alternativa é a morte!”
Nasrudim respondeu:”Vou ser enforcado naquela forca”.
O guarda replicou:”É mentira!”
Nasrudim insistiu:”Pois, muito bem, se eu disse uma mentira, enforque-me!”
O guarda todo confuso e angustiado suspirou:”Mas, se eu fizer isso, você terá dito à verdade”.
Nasrudim completa:”Exatamente, a sua VERDADE!”
CONSIDERAÇÕES
As pessoas têm vivido, continuamente, através de condicionamentos, e por se submeterem a isso, repetem sem cessar inúmeras crenças, sem sequer experimentar o que elas realmente significam. Além disso, perdem o poder pessoal para tomar decisões sobre certas situações de sua vida. O resultado é que mergulham em qualquer teoria que proclame ter o poder “divino” para decidir isso por ela. Saber que existe algo ou alguém que assume esse compromisso de moldar sua vida pode dar para certas pessoas um certo conforto e proteção, no entanto, tira o que é mais precioso na vida: a liberdade!
Nasrudim respondeu:”Vou ser enforcado naquela forca”.
O guarda replicou:”É mentira!”
Nasrudim insistiu:”Pois, muito bem, se eu disse uma mentira, enforque-me!”
O guarda todo confuso e angustiado suspirou:”Mas, se eu fizer isso, você terá dito à verdade”.
Nasrudim completa:”Exatamente, a sua VERDADE!”
CONSIDERAÇÕES
As pessoas têm vivido, continuamente, através de condicionamentos, e por se submeterem a isso, repetem sem cessar inúmeras crenças, sem sequer experimentar o que elas realmente significam. Além disso, perdem o poder pessoal para tomar decisões sobre certas situações de sua vida. O resultado é que mergulham em qualquer teoria que proclame ter o poder “divino” para decidir isso por ela. Saber que existe algo ou alguém que assume esse compromisso de moldar sua vida pode dar para certas pessoas um certo conforto e proteção, no entanto, tira o que é mais precioso na vida: a liberdade!
Qual a idéia mais perigosa da religião?
A religião é uma das forças mais potentes em questões humanas. Inspirou alguns dos momentos mais sublimes da história, mas também alguns de seus mais bárbaros.
A Inquisição, explosões de clínicas de aborto, ataques suicidas no Iraque - tudo isso tem raízes em alguma forma de ideologia religiosa.
Com isso em mente, fizemos a mesma pergunta a cinco pensadores religiosos de diferentes crenças: qual é a idéia mais perigosa na religião hoje? Seus comentários foram editados por questões de brevidade e clareza.
Violência em nome de Deus - Richard Land
"Concordo com o papa João Paulo II, que disse que há um santuário sagrado da alma para cada homem e mulher. Nenhum outro ser humano tem o direito de interferir coercivamente com esse santuário sagrado da alma. A idéia mais perigosa na religião é a idéia que a força coerciva, violenta, é permissível em nome de Deus - qualquer Deus."
"Você vê isso no islamismo radical. Observe que eu disse radical, não islamismo apenas. A maior parte das pessoas morrerá se essa idéia se espalhar. Ajudará a envenenar o poço do debate e discussão sobre questões que as pessoas discordam. É corrosiva ao discurso público dizer que, se você discordar de mim, vou matar você. Faz erodir a liberdade de expressão, a assembléia e a adoração."
Richard Land é presidente da Comissão de Ética e Liberdade Religiosa da Convenção Batista do Sul. Ele foi selecionado pela revista Times em 2005 como um dos 25 evangélicos mais influentes nos EUA
Siga as regras ou... - Wayne Dyer
"Carl Jung (autor e psicanalista) tinha uma frase. A paráfrase é: o principal problema da religião organizada é que o propósito da religião organizada é impedir as pessoas de terem a experiência direta de Deus. A religião é organizada em torno do princípio que a religião dará a experiência direta de Deus a você, desde que você se torne membro, siga as regras e contribua financeiramente."
"A coisa mais importante que um ser humano pode reconhecer é que já está conectado a Deus, e essa conexão não é algo que se pode entregar a outra pessoa ou organização. Uma das verdades do mundo físico é que você é como aquilo do que você veio. Se você se pergunta como é uma torta de maçã, é como a maçã de onde veio".
Wayne Dyer é um dos palestrantes de auto-ajuda mais populares do país. Ele é autor de 29 livros e apareceu freqüentemente em especiais da PBS
Minha religião está certa - Rabino Harold Kushner
"Há uma noção que diz que, para eu estar certo, todo mundo que discorda de mim está errado. Ela torna a cooperação entre religiões mais difícil. Se eu acredito nisso, tenho que acreditar que a religião dos outros não presta, é inválida."
"Você tem que entender que a religião não é sobre receber informações sobre Deus. Religião é sobre comunidade. O propósito primário não é nos levar ao céu, mas nos colocar em contato com as outras pessoas. Posso ter feroz lealdade a minha família sem denegrir a família dos outros. Posso ter feroz lealdade a minha religião sem denegrir a religião dos outros. Da mesma forma, meu vizinho pode dizer que sua esposa é a mulher mais maravilhosa do mundo. Posso tomar isso como declaração de amor, não como fato."
O rabino Harold Kushner é um dos pensadores judeus mais famosos do país. Ele é conhecido por seu livro campeão de vendas "Quando Coisas Ruins Acontecem às Pessoas Boas"
Converter outros para sua religião - Dr. Abdullahi Ahmed Na-Na'im
"Não acreditaria em uma religião, se não acreditasse que é melhor que as outras. A noção de superioridade e exclusividade é inerente à crença religiosa. Pode ser perigosa ou não."
"A idéia de trabalho missionário é muito carregada e perigosa, porque freqüentemente envolve simplesmente apresentar crenças para alguém aceitar ou rejeitar. Sempre está baseada em poder. Os que têm a capacidade de proselitismo são mais poderosos. Têm os recursos para estabelecer escolas, hospitais. O trabalho missionário não é neutro. Tem base no poder. Você não encontra muçulmanos saindo para fazer proselitismo nos EUA. Mas você encontra americanos indo para todo tipo de país muçulmano."
Dr. Abdullahi Ahmed Na-Na'im é acadêmico internacionalmente reconhecido do islã e de direitos humanos. Ele é professor da Universidade de Emory
Uma visão tribal de Deus - Deepak Chopra
"A idéia mais perigosa é: meu Deus é o único Deus verdadeiro e minha religião é a única verdadeira. Leva a brigas, divisões, terrorismo, preconceito, racismo e banhos de sangue."
"As noções religiosas são programadas em nossa consciência em uma idade muito tenra. Achamos que são verdade. É muito difícil deixar essa condição, mesmo diante do raciocínio intelectual, por causa do aprisionamento emocional a nossa condição. Lutamos com emoções quando nossas crenças são ameaçadas."
"Estamos em um ponto crítico em nossa evolução. Estamos começando a tomar consciência. Sabemos muito sobre a natureza. Temos uma boa idéia sobre o início do universo. Compreendemos em alguma extensão as leis da física, química e biologia. Ainda assim, para a vasta maioria das pessoas, apesar de termos telefones celulares e podermos fabricar bombas atômicas, nossa evolução psicológica e espiritual está em um nível muito tribal."
Deepak Chopra é diretor e co-fundador do Centro Chopra de Bem Estar em Carlsbad, Califórnia. Ele é autor e palestrante famoso por integrar a medicina Ocidental com tradições de cura natural do Oriente
Insossa Eternidade - Rogério
Estava eu sentado sobre uma das muitas pedras a margem rio Guaíba, perto da Usina do Gasômetro e estava a contemplar as ondas que surgiam e voltavam para o rio. Olhando-as percebo na essência delas, que sua natureza é sempre a mesma e retornam sempre ao todo de onde surgiram.
Impermanentes.
O que me fez verificar o senso que temos da imortalidade. Imortalidade é nunca morrer, nunca ter um fim. Mas analisando em profundidade, para ser imortal não se pode viver pois, se fôssemos vivos e imortais, duvido que não procuraríamos um meio de nos matar.
O que nos dá prazer e dor a nossa vida senão os nossos sentidos? Nossos sentidos tem inúmeras funções cada um a seu modo nos permite ter contato com o mundo que nos rodeia. No entanto, se fossemos imortais, os sentidos não seriam de forma alguma algo útil. Analisemos:
Paladar: como imortal, não necessitaria comer para sobreviver, logo sentir o gosto pelas coisas seria deveras sem relevância.
Olfato: nosso olfato é uma extensão, dizem alguns, de nosso paladar. Sendo imortais os odores nos seriam inúteis uma vez que eles nos ajudam a identificar o que deve ou não ser consumido. Adicionalmente os odores nos ajudam a captar Feromônios úteis segundo pesquisas para a escolha do nosso(a) parceiros sexuais. Porque faria sexo para preservar minha espécie se vivo eternamente???
Visão: Me arrisco dizer que é o nosso principal sentido. Nossa visão nos permite enxergar os perigos e nossas necessidades para que sobrevivamos. De que utilidade seria nossa visão então?
Tato: dor e prazer estão relacionados a este sentido. Ambos necessários para nossa sobrevivência como indivíduo e como espécie.
Audição: nossos ouvidos nos auxiliam a perceber as vibrações no ar permitindo nossa comunicação com outros e percepção de perigos.
Mente: e quando chegássemos ao ponto de nos conhecer tão profundamente que nada mais há a ser descoberto?
Ademais, necessitamos do fato de que morreremos um dia para motivar-nos a fazer as coisas. Mesmo o mais fervoroso eternalista necessita dela, a dona morte e sua foice para seguir seu credo.
Mas digamos que tivéssemos todos estes sentidos:
Pois digo que insosso se tornará a realidade daquele que é eterno, pois se fossemos eternos e atingíssimos o limiar de todo conhecimento transcendente, nos faltaria ainda a experiência da não existência para compreendermos plenamente todas as coisas... E, se retornássemos desta não existência o que mais haveria de interessante para nós?
Se fossemos eternos também teríamos de dar, eternamente, sentido a nossa existência. E quando tudo mais já tiver sido, vez após vez, esmiuçado diante de nossa ânsia de darmos sentido a tudo?
Sinceramente? Prefiro ser o mortal. Aquele ser que os deuses e seres espirituais diversos consideram segundo suas mitologias, seres inferiores, porque morrem... Prefiro buscar as coisas nas coisas pelo que elas são enquanto vivo do que abraçar a eterna insatisfação de ter de encontrar um sentido para minha existência que um dia ficará sem sentido...
A realidade é o “agora” e só...
E agora eu vou comer minha barrinha de chocolate...
Impermanentes.
O que me fez verificar o senso que temos da imortalidade. Imortalidade é nunca morrer, nunca ter um fim. Mas analisando em profundidade, para ser imortal não se pode viver pois, se fôssemos vivos e imortais, duvido que não procuraríamos um meio de nos matar.
O que nos dá prazer e dor a nossa vida senão os nossos sentidos? Nossos sentidos tem inúmeras funções cada um a seu modo nos permite ter contato com o mundo que nos rodeia. No entanto, se fossemos imortais, os sentidos não seriam de forma alguma algo útil. Analisemos:
Paladar: como imortal, não necessitaria comer para sobreviver, logo sentir o gosto pelas coisas seria deveras sem relevância.
Olfato: nosso olfato é uma extensão, dizem alguns, de nosso paladar. Sendo imortais os odores nos seriam inúteis uma vez que eles nos ajudam a identificar o que deve ou não ser consumido. Adicionalmente os odores nos ajudam a captar Feromônios úteis segundo pesquisas para a escolha do nosso(a) parceiros sexuais. Porque faria sexo para preservar minha espécie se vivo eternamente???
Visão: Me arrisco dizer que é o nosso principal sentido. Nossa visão nos permite enxergar os perigos e nossas necessidades para que sobrevivamos. De que utilidade seria nossa visão então?
Tato: dor e prazer estão relacionados a este sentido. Ambos necessários para nossa sobrevivência como indivíduo e como espécie.
Audição: nossos ouvidos nos auxiliam a perceber as vibrações no ar permitindo nossa comunicação com outros e percepção de perigos.
Mente: e quando chegássemos ao ponto de nos conhecer tão profundamente que nada mais há a ser descoberto?
Ademais, necessitamos do fato de que morreremos um dia para motivar-nos a fazer as coisas. Mesmo o mais fervoroso eternalista necessita dela, a dona morte e sua foice para seguir seu credo.
Mas digamos que tivéssemos todos estes sentidos:
Pois digo que insosso se tornará a realidade daquele que é eterno, pois se fossemos eternos e atingíssimos o limiar de todo conhecimento transcendente, nos faltaria ainda a experiência da não existência para compreendermos plenamente todas as coisas... E, se retornássemos desta não existência o que mais haveria de interessante para nós?
Se fossemos eternos também teríamos de dar, eternamente, sentido a nossa existência. E quando tudo mais já tiver sido, vez após vez, esmiuçado diante de nossa ânsia de darmos sentido a tudo?
Sinceramente? Prefiro ser o mortal. Aquele ser que os deuses e seres espirituais diversos consideram segundo suas mitologias, seres inferiores, porque morrem... Prefiro buscar as coisas nas coisas pelo que elas são enquanto vivo do que abraçar a eterna insatisfação de ter de encontrar um sentido para minha existência que um dia ficará sem sentido...
A realidade é o “agora” e só...
E agora eu vou comer minha barrinha de chocolate...
O Nariz - Luis Fernando Veríssimo
Era um dentista, respeitadíssimo. Com seus quarenta e poucos anos, uma filha quase na faculdade. Um homem sério, sóbrio, sem opiniões surpreendentes mas uma sólida reputação como profissional e cidadão. Um dia, apareceu em casa com um nariz postiço. Passado o susto, a mulher e a filha sorriram com fingida tolerância. Era um daqueles narizes de borracha com óculos de aros pretos, sombrancelhas e bigodes que fazem a pessoa ficar parecida com o Groucho Marx. Mas o nosso dentista não estava imitando o Groucho Marx. Sentou-se à mesa do almoço – sempre almoçava em casa – com a retidão costumeira, quieto e algo distraído. Mas com um nariz postiço.
- O que é isso? – perguntou a mulher depois da salada, sorrindo menos.
- Isso o quê?
- Esse nariz.
- Ah. Vi numa vitrina, entrei e comprei.
- Logo você, papai...
Depois do almoço, ele foi recostar-se no sofá da sala, como fazia todos os dias. A mulher impacientou-se.
- Tire esse negócio.
- Por quê?
- Brincadeira tem hora.
- Mas isto não é brincadeira.
Sesteou com o nariz de borracha para o alto. Depois de meia hora, levantou-se e dirigiu-se para a porta. A mulher o interpelou.
- Aonde é que você vai?
- Como, aonde é que eu vou? Vou voltar para o consultório.
- Mas com esse nariz?
- Eu não compreendo você – disse ele, olhando-a com censura através dos aros sem lentes. – Se fosse uma gravata nova você não diria nada. Só porque é um nariz...
- Pense nos vizinhos. Pense nos cliente.
Os clientes, realmente, não compreenderam o nariz de borracha. Deram risadas (“Logo o senhor, doutor...”) fizeram perguntas, mas terminaram a consulta intrigados e saíram do consultório com dúvidas.
- Ele enlouqueceu?
- Não sei – respondia a recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos. – Nunca vi ele assim. Naquela noite ele tomou seu chuveiro, como fazia sempre antes de dormir. Depois vestiu o pijama e o nariz postiço e foi se deitar.
- Você vai usar esse nariz na cama? – perguntou a mulher.
- Vou. Aliás, não vou mais tirar esse nariz.
- Mas, por quê?
- Por quê não?
Dormiu logo. A mulher passou metade da noite olhando para o nariz de borracha. De madrugada começou a chorar baixinho. Ele enlouquecera. Era isto. Tudo estava acabado. Uma carreira brilhante, uma reputação, um nome, uma família perfeita, tudo trocado por um nariz postiço.
- Papai...
- Sim, minha filha.
- Podemos conversar?
- Claro que podemos.
- É sobre esse nariz...
- O meu nariz outra vez? Mas vocês só pensam nisso?
- Papai, como é que nós não vamos pensar? De uma hora para outra um homem como você resolve andar de nariz postiço e não quer que ninguém note?
- O nariz é meu e vou continuar a usar.
- Mas, por que, papai? Você não se dá conta de que se transformou no palhaço do prédio? Eu não posso mais encarar os vizinhos, de vergonha. A mamãe não tem mais vida social.
- Não tem porque não quer...
- Como é que ela vai sair na rua com um homem de nariz postiço?
- Mas não sou “um homem”. Sou eu. O marido dela. O seu pai. Continuo o mesmo homem. Um nariz de borracha não faz nenhuma diferença.
- Se não faz nenhuma diferença, então por que usar?
- Se não faz diferença, porque não usar?
- Mas, mas...
- Minha filha...
- Chega! Não quero mais conversar. Você não é mais meu pai!
A mulher e a filha saíram de casa. Ele perdeu todos os clientes. A recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos, pediu demissão. Não sabia o que esperar de um homem que usava nariz postiço. Evitava aproximar-se dele. Mandou o pedido de demissão pelo correio. Os amigos mais chegados, numa última tentativa de salvar sua reputação, o convenceram a consultar um psiquiatra.
- Você vai concordar – disse o psiquiatra, depois de concluir que não havia nada de errado com ele – que seu comportamento é um pouco estranho...
- Estranho é o comportamento dos outros! – disse ele. – Eu continuo o mesmo. Noventa e dois por cento de meu corpo continua o que era antes. Não mudei a maneira de vestir, nem de pensar, nem de me comportar, Continuo sendo um ótimo dentista, um bom marido, bom pai, contribuinte, sócio do Fluminense, tudo como era antes.
- Mas as pessoas repudiam todo o resto por causa deste nariz. Um simples nariz de borracha. Quer dizer que eu não sou eu, eu sou o meu nariz?
- É... – disse o psiquiatra. – Talvez você tenha razão...
O que é que você acha, leitor? Ele tem razão? Seja como for, não se entregou. Continua a usar nariz postiço. Porque agora não é mais uma questão de nariz. Agora é uma questão de princípios.
- O que é isso? – perguntou a mulher depois da salada, sorrindo menos.
- Isso o quê?
- Esse nariz.
- Ah. Vi numa vitrina, entrei e comprei.
- Logo você, papai...
Depois do almoço, ele foi recostar-se no sofá da sala, como fazia todos os dias. A mulher impacientou-se.
- Tire esse negócio.
- Por quê?
- Brincadeira tem hora.
- Mas isto não é brincadeira.
Sesteou com o nariz de borracha para o alto. Depois de meia hora, levantou-se e dirigiu-se para a porta. A mulher o interpelou.
- Aonde é que você vai?
- Como, aonde é que eu vou? Vou voltar para o consultório.
- Mas com esse nariz?
- Eu não compreendo você – disse ele, olhando-a com censura através dos aros sem lentes. – Se fosse uma gravata nova você não diria nada. Só porque é um nariz...
- Pense nos vizinhos. Pense nos cliente.
Os clientes, realmente, não compreenderam o nariz de borracha. Deram risadas (“Logo o senhor, doutor...”) fizeram perguntas, mas terminaram a consulta intrigados e saíram do consultório com dúvidas.
- Ele enlouqueceu?
- Não sei – respondia a recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos. – Nunca vi ele assim. Naquela noite ele tomou seu chuveiro, como fazia sempre antes de dormir. Depois vestiu o pijama e o nariz postiço e foi se deitar.
- Você vai usar esse nariz na cama? – perguntou a mulher.
- Vou. Aliás, não vou mais tirar esse nariz.
- Mas, por quê?
- Por quê não?
Dormiu logo. A mulher passou metade da noite olhando para o nariz de borracha. De madrugada começou a chorar baixinho. Ele enlouquecera. Era isto. Tudo estava acabado. Uma carreira brilhante, uma reputação, um nome, uma família perfeita, tudo trocado por um nariz postiço.
- Papai...
- Sim, minha filha.
- Podemos conversar?
- Claro que podemos.
- É sobre esse nariz...
- O meu nariz outra vez? Mas vocês só pensam nisso?
- Papai, como é que nós não vamos pensar? De uma hora para outra um homem como você resolve andar de nariz postiço e não quer que ninguém note?
- O nariz é meu e vou continuar a usar.
- Mas, por que, papai? Você não se dá conta de que se transformou no palhaço do prédio? Eu não posso mais encarar os vizinhos, de vergonha. A mamãe não tem mais vida social.
- Não tem porque não quer...
- Como é que ela vai sair na rua com um homem de nariz postiço?
- Mas não sou “um homem”. Sou eu. O marido dela. O seu pai. Continuo o mesmo homem. Um nariz de borracha não faz nenhuma diferença.
- Se não faz nenhuma diferença, então por que usar?
- Se não faz diferença, porque não usar?
- Mas, mas...
- Minha filha...
- Chega! Não quero mais conversar. Você não é mais meu pai!
A mulher e a filha saíram de casa. Ele perdeu todos os clientes. A recepcionista, que trabalhava com ele há 15 anos, pediu demissão. Não sabia o que esperar de um homem que usava nariz postiço. Evitava aproximar-se dele. Mandou o pedido de demissão pelo correio. Os amigos mais chegados, numa última tentativa de salvar sua reputação, o convenceram a consultar um psiquiatra.
- Você vai concordar – disse o psiquiatra, depois de concluir que não havia nada de errado com ele – que seu comportamento é um pouco estranho...
- Estranho é o comportamento dos outros! – disse ele. – Eu continuo o mesmo. Noventa e dois por cento de meu corpo continua o que era antes. Não mudei a maneira de vestir, nem de pensar, nem de me comportar, Continuo sendo um ótimo dentista, um bom marido, bom pai, contribuinte, sócio do Fluminense, tudo como era antes.
- Mas as pessoas repudiam todo o resto por causa deste nariz. Um simples nariz de borracha. Quer dizer que eu não sou eu, eu sou o meu nariz?
- É... – disse o psiquiatra. – Talvez você tenha razão...
O que é que você acha, leitor? Ele tem razão? Seja como for, não se entregou. Continua a usar nariz postiço. Porque agora não é mais uma questão de nariz. Agora é uma questão de princípios.
Karl Marx e a religião: ópio do povo?
Para muitos, Karl Marx no rótulo ateu, era um perseguidor das religiões e uma pessoa sem coração ou mesmo sem escrúpulos. A famosa frase da religião como sendo o ópio do povo, não é tão óbvia assim.
“Não se pode dizer que, para Marx, a religião é simples invenção de sacerdotes falsários ou de dominadores. É a manifestação da humanidade sofredora em busca de consolo. É ópio pra o povo, um calmante para as massas que sofrem a miséria produzida pela exploração econômica. Mas os exploradores burgueses também precisam de religião”.
É interessante notar que Marx via a religião não como algo primordial a ser combatido, pois ela apenas era um reflexo do que realmente estava acontecendo. A religião poderia servir como aroma tranqüilizador para muitas consciências e narcótico ou ópio para um consolo inútil, ou seja, independente da classe social, ela estaria sempre presente na vida das pessoas. O que deveria se combater então?
“Para Marx, a religião aliena o homem. A alienação religiosa deve ser esclarecida a partir da situação histórico-social concreta. Mas a religião é a expressão da alienação do homem e não seu fundamento. Antes, é o resultado. A essência da alienação do homem encontra-se no contexto econômico, no tipo de relações de produção geradas pelo mundo capitalista. Aí há duas classes sociais: os proprietários dos meios de produção e os não proprietários. Destruindo essa estrutura econômica também se destrói a religião que é seu produto. São as estruturas econômicas que, segundo Marx, geram a falsa consciência, que é a religião”.
“Marx conclui que, sendo a religião reflexo espiritual da miséria real do homem numa sociedade opressora, a superação da religião não se dará só pela crítica intelectual. De nada serviria privar o povo do ópio e não mudar nada”.
Como deu para perceber, o termo “alienação” vai muito além do que conhecemos hoje em dia, como em frases tipo: esse cara é alienado, ou sem rumo. É um termo que quer dizer que a pessoa foi privada de seus direitos fundamentais, passando a ser considerada um objeto, algo a ser usado. Ora, a alienação religiosa funda-se, segundo Marx, na alienação econômica. Por isso não há necessidade, teoricamente, de combatê-la, pois ninguém sentirá sua falta, isso tudo segundo a sua vontade que houvesse uma revolução, onde o homem assumiria ele mesmo a transformação social. Mas, isso já é uma outra história, aqui vale somente a orientação de como Marx observava a religião, e como ateu, muitos pensavam até que ele fosse mais radical nesse quesito, mas por incrível que pareça seus ideais tinham como baluarte ou suporte apenas a igualdade entre os homens!
Entre aspas retirado do Livro Filosofia da Religão de Urbano Zilles.
“Não se pode dizer que, para Marx, a religião é simples invenção de sacerdotes falsários ou de dominadores. É a manifestação da humanidade sofredora em busca de consolo. É ópio pra o povo, um calmante para as massas que sofrem a miséria produzida pela exploração econômica. Mas os exploradores burgueses também precisam de religião”.
É interessante notar que Marx via a religião não como algo primordial a ser combatido, pois ela apenas era um reflexo do que realmente estava acontecendo. A religião poderia servir como aroma tranqüilizador para muitas consciências e narcótico ou ópio para um consolo inútil, ou seja, independente da classe social, ela estaria sempre presente na vida das pessoas. O que deveria se combater então?
“Para Marx, a religião aliena o homem. A alienação religiosa deve ser esclarecida a partir da situação histórico-social concreta. Mas a religião é a expressão da alienação do homem e não seu fundamento. Antes, é o resultado. A essência da alienação do homem encontra-se no contexto econômico, no tipo de relações de produção geradas pelo mundo capitalista. Aí há duas classes sociais: os proprietários dos meios de produção e os não proprietários. Destruindo essa estrutura econômica também se destrói a religião que é seu produto. São as estruturas econômicas que, segundo Marx, geram a falsa consciência, que é a religião”.
“Marx conclui que, sendo a religião reflexo espiritual da miséria real do homem numa sociedade opressora, a superação da religião não se dará só pela crítica intelectual. De nada serviria privar o povo do ópio e não mudar nada”.
Como deu para perceber, o termo “alienação” vai muito além do que conhecemos hoje em dia, como em frases tipo: esse cara é alienado, ou sem rumo. É um termo que quer dizer que a pessoa foi privada de seus direitos fundamentais, passando a ser considerada um objeto, algo a ser usado. Ora, a alienação religiosa funda-se, segundo Marx, na alienação econômica. Por isso não há necessidade, teoricamente, de combatê-la, pois ninguém sentirá sua falta, isso tudo segundo a sua vontade que houvesse uma revolução, onde o homem assumiria ele mesmo a transformação social. Mas, isso já é uma outra história, aqui vale somente a orientação de como Marx observava a religião, e como ateu, muitos pensavam até que ele fosse mais radical nesse quesito, mas por incrível que pareça seus ideais tinham como baluarte ou suporte apenas a igualdade entre os homens!
Entre aspas retirado do Livro Filosofia da Religão de Urbano Zilles.
Sobre a salvação da minha alma - Rubem Alves
As coisas que tenho dito sobre Deus fizeram com que muitos dos meus leitores ficassem temerosos sobre o futuro de minha alma, no outro mundo. Acham que vou para o inferno. Eles pensam que, se a gente não pensar certo, Deus castiga. No inferno estão os pecadores que roubaram, fornicaram e mataram, e aqueles que ousaram pensar suas próprias idéias. Pensar certo, na cabeça deles, é pensar do jeito como pensam os padres e os pastores. Para tranquilizá-los vou me explicar.
Sobre a Bíblia. Eu a estudei muito e a amo. Para mim ela é um poema cujas palavras me confortam e me fazem mais sábio. Mas é preciso fazer uma distinção entre as palavras do poema, escritas, e aquilo que as pessoas pensam, ao lê-lo. Toda leitura é uma interpretação, isto é, os pensamentos das pessoas que a lêem. Todo sermão é pensamento de um homem e não pensamento de Deus. A interpretação é diferente do poema. Cada igreja, cada congregação, cada seita se organiza em torno de uma interpretação particular, palavra de homem. Mas cada uma delas tem a ilusão de que a sua interpretação é a Palavra de Deus. Sendo a Palavra de Deus, é única verdadeira. É muita presunção pensar que somente a minha seita interpreta certo e todas as outras interpretam errado. O que eu escrevo é a minha interpretação, tão problemática quanto qualquer outra. É preciso não se esquecer da sábia afirmação do apóstolo Paulo: Nós não sabemos direito as coisas; o que vemos são reflexos trêmulos e obscuros num espelho mal polido. É preciso não confundir os reflexos no espelho com o rosto verdadeiro que ninguém jamais viu. De Deus, a única coisa absolutamente certa que conhecemos é o amor (1 Cor. 13).
O que é a fé? É também uma questão de interpretação. Pessoas há que pensam que fé é um recurso mágico que garante que Deus vai nos atender. Para elas um Deus que não atende pedidos é um Deus muito fraco. Elas desejam garantias. Na minha interpretação fé é uma relação de confiança com Deus: é flutuar num mar de amor, como se flutua na água. Quem é que ama mais o pai? Aquele que é fiel ao pai porque ele lhe dá os presentes pedidos, ou aquele que ama o pai, mesmo que ele não lhe dê presentes? A gente ama o pai é pelos presentes, bênçãos, que ele dá, ou por ele mesmo? Amo a Deus mesmo que não me dê presentes.
Acho que Cristo enche todos os espaços do universo. Lutero falava da ubiquidade do corpo de Cristo e dizia que ele está presente até na menor folha, muito embora nas folhas o nome dele não esteja escrito. Quem ama uma folha ama Cristo. Quem tem amor respira Cristo, mesmo que não fale o nome dele. Tiago diz que os demônios sabem tudo sobre Deus e, no entanto, são demônios. Os reformadores falavam no Christo absconditus – isso é, o Cristo escondido, invisível, sem nome, em toda a Criação. Quem ama, mesmo que não cite as Escrituras e nem saiba o nome de Cristo, está nele. Cristo não pode ser engarrafado em nomes religiosos. Isso seria heresia, negar a sua onipresença.
As Escrituras Sagradas são um livro enorme. Muitos dizem que as Escrituras inteiras são inspiradas. Se realmente acreditam nisso, então todos os textos têm de ser objeto do nosso amor, são “palavras de Deus“. Noto, entretanto, que eles se comportam como se alguns textos fossem mais inspirados do que outros. Fazem silêncio sobre muitos textos. Por exemplo, nunca ouvi sermão católico ou evangélico sobre “Amada minha, em tua língua há mel e leite. Teus seios são como duas crias gêmeas de gazela...“ (Cânticos 4:11, 5); “Anda, come teu pão com alegria e bebe contente o teu vinho... Goza a vida com a mulher que amas todos os dias da tua vida...“ (Ecl. 9:7 e 9). Por que o silêncio? Acho que, secretamente, eles acreditam que uns textos são mais palavra de Deus do que outros...
E quanto ao destino de minha alma, não se preocupem. Foi Jesus mesmo que disse aos fariseus, religiosos que viviam citando as Escrituras e tentando converter os outros, que as meretrizes entrariam no Reino dos Céus antes deles. E notem: Jesus não disse: meretrizes arrependidas. Entram as meretrizes mesmo. Depois delas, então, entram os fariseus hipócritas e tudo o mais que Deus criou. Deus criou tudo, não é? Se ele criou tudo, vocês acham que ele ia entregar ao Diabo aquilo que saiu das suas mãos? Um Deus que é todo amor não pode ter, na eternidade, uma câmara de torturas sem fim em que as almas sofrem por pecados cometidos no tempo. Dívidas no tempo ficam dívidas eternas? Só se Deus for dono de banco...Quem iria ficar feliz com isso é o Diabo. E vocês acham que Deus está a fim de realizar os desejos do Diabo? No fim, o amor de Deus triunfa! E nós todos, vocês, eu, meretrizes, e tudo o mais, estaremos entrando...
(Transparências da eternidade, Verus, 2002)
Sobre a Bíblia. Eu a estudei muito e a amo. Para mim ela é um poema cujas palavras me confortam e me fazem mais sábio. Mas é preciso fazer uma distinção entre as palavras do poema, escritas, e aquilo que as pessoas pensam, ao lê-lo. Toda leitura é uma interpretação, isto é, os pensamentos das pessoas que a lêem. Todo sermão é pensamento de um homem e não pensamento de Deus. A interpretação é diferente do poema. Cada igreja, cada congregação, cada seita se organiza em torno de uma interpretação particular, palavra de homem. Mas cada uma delas tem a ilusão de que a sua interpretação é a Palavra de Deus. Sendo a Palavra de Deus, é única verdadeira. É muita presunção pensar que somente a minha seita interpreta certo e todas as outras interpretam errado. O que eu escrevo é a minha interpretação, tão problemática quanto qualquer outra. É preciso não se esquecer da sábia afirmação do apóstolo Paulo: Nós não sabemos direito as coisas; o que vemos são reflexos trêmulos e obscuros num espelho mal polido. É preciso não confundir os reflexos no espelho com o rosto verdadeiro que ninguém jamais viu. De Deus, a única coisa absolutamente certa que conhecemos é o amor (1 Cor. 13).
O que é a fé? É também uma questão de interpretação. Pessoas há que pensam que fé é um recurso mágico que garante que Deus vai nos atender. Para elas um Deus que não atende pedidos é um Deus muito fraco. Elas desejam garantias. Na minha interpretação fé é uma relação de confiança com Deus: é flutuar num mar de amor, como se flutua na água. Quem é que ama mais o pai? Aquele que é fiel ao pai porque ele lhe dá os presentes pedidos, ou aquele que ama o pai, mesmo que ele não lhe dê presentes? A gente ama o pai é pelos presentes, bênçãos, que ele dá, ou por ele mesmo? Amo a Deus mesmo que não me dê presentes.
Acho que Cristo enche todos os espaços do universo. Lutero falava da ubiquidade do corpo de Cristo e dizia que ele está presente até na menor folha, muito embora nas folhas o nome dele não esteja escrito. Quem ama uma folha ama Cristo. Quem tem amor respira Cristo, mesmo que não fale o nome dele. Tiago diz que os demônios sabem tudo sobre Deus e, no entanto, são demônios. Os reformadores falavam no Christo absconditus – isso é, o Cristo escondido, invisível, sem nome, em toda a Criação. Quem ama, mesmo que não cite as Escrituras e nem saiba o nome de Cristo, está nele. Cristo não pode ser engarrafado em nomes religiosos. Isso seria heresia, negar a sua onipresença.
As Escrituras Sagradas são um livro enorme. Muitos dizem que as Escrituras inteiras são inspiradas. Se realmente acreditam nisso, então todos os textos têm de ser objeto do nosso amor, são “palavras de Deus“. Noto, entretanto, que eles se comportam como se alguns textos fossem mais inspirados do que outros. Fazem silêncio sobre muitos textos. Por exemplo, nunca ouvi sermão católico ou evangélico sobre “Amada minha, em tua língua há mel e leite. Teus seios são como duas crias gêmeas de gazela...“ (Cânticos 4:11, 5); “Anda, come teu pão com alegria e bebe contente o teu vinho... Goza a vida com a mulher que amas todos os dias da tua vida...“ (Ecl. 9:7 e 9). Por que o silêncio? Acho que, secretamente, eles acreditam que uns textos são mais palavra de Deus do que outros...
E quanto ao destino de minha alma, não se preocupem. Foi Jesus mesmo que disse aos fariseus, religiosos que viviam citando as Escrituras e tentando converter os outros, que as meretrizes entrariam no Reino dos Céus antes deles. E notem: Jesus não disse: meretrizes arrependidas. Entram as meretrizes mesmo. Depois delas, então, entram os fariseus hipócritas e tudo o mais que Deus criou. Deus criou tudo, não é? Se ele criou tudo, vocês acham que ele ia entregar ao Diabo aquilo que saiu das suas mãos? Um Deus que é todo amor não pode ter, na eternidade, uma câmara de torturas sem fim em que as almas sofrem por pecados cometidos no tempo. Dívidas no tempo ficam dívidas eternas? Só se Deus for dono de banco...Quem iria ficar feliz com isso é o Diabo. E vocês acham que Deus está a fim de realizar os desejos do Diabo? No fim, o amor de Deus triunfa! E nós todos, vocês, eu, meretrizes, e tudo o mais, estaremos entrando...
(Transparências da eternidade, Verus, 2002)
sexta-feira, 3 de julho de 2009
Nada é impossivel de mudar - Bertolt Brecht
Nada é impossível de mudar,
Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,
pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar.
Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de hábito como coisa natural,
pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural, nada deve parecer impossível de mudar.
terça-feira, 30 de junho de 2009
Sejam bem vindos ao meu Blog...sigam o coelho branco!
Começo esse Blog com as sábias palavras de Paulo Freire:
"Daí o meu nenhum interesse de, não importa que ordem, assumir um ar de observador imparcial, objetivo, seguro, dos fatos e acontecimentos. Em tempo algum pude ser um observador 'acinzentadamente' imparcial, o que, porém, jamais me afastou de uma posição rigorosamente ética".
Resolvi finalmente fazer um Blog sobre temas que fazem parte da minha vida e de meus estudos. Pretendo abordar as diversas formas de espiritualidade, religiosidade, agnosticismo e ateísmo sempre num intuito de aprofundar o conhecimento, emancipar as idéias e lutar contra todo tipo de intolerância e fanatismo.
Muitas vezes nos deparamos pensativos sobre os por quês de nossa existência! Qual nossa missão nessa vida, se existe outra além da matéria, se seres espirituais nos ajudam ou mesmo como viver plenamente e satisfatoriamente o presente. Toda essa movimentação do pensar gera perguntas e consequentes obstáculos para obtenção das respostas, sendo necessário uma ação enérgica de nossa parte para superar esses desafios, mesmo tendo a dúvida e o medo como guias. Crescer, nos mais variados sentidos, requer uma transformação que muitas vezes é demorada e dolorosa, sendo poucos os que se arriscam nesse terreno movediço.
"Daí o meu nenhum interesse de, não importa que ordem, assumir um ar de observador imparcial, objetivo, seguro, dos fatos e acontecimentos. Em tempo algum pude ser um observador 'acinzentadamente' imparcial, o que, porém, jamais me afastou de uma posição rigorosamente ética".
Resolvi finalmente fazer um Blog sobre temas que fazem parte da minha vida e de meus estudos. Pretendo abordar as diversas formas de espiritualidade, religiosidade, agnosticismo e ateísmo sempre num intuito de aprofundar o conhecimento, emancipar as idéias e lutar contra todo tipo de intolerância e fanatismo.
Muitas vezes nos deparamos pensativos sobre os por quês de nossa existência! Qual nossa missão nessa vida, se existe outra além da matéria, se seres espirituais nos ajudam ou mesmo como viver plenamente e satisfatoriamente o presente. Toda essa movimentação do pensar gera perguntas e consequentes obstáculos para obtenção das respostas, sendo necessário uma ação enérgica de nossa parte para superar esses desafios, mesmo tendo a dúvida e o medo como guias. Crescer, nos mais variados sentidos, requer uma transformação que muitas vezes é demorada e dolorosa, sendo poucos os que se arriscam nesse terreno movediço.
A jornada começou...
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