“Historicamente, a intolerância está presente na esfera das relações humanas fundadas em sentimentos e crenças religiosas. É uma prática que se autojustifica em nome de Deus; adquire o status de uma guerra de deuses encarnados em homens e mulheres que se odeiam e não se suportam.” ( Antonio Ozaí da Silva )
“De algo sempre haveremos de morrer, mas já se perdeu a conta aos seres humanos mortos das piores maneiras que seres humanos foram capazes de inventar. Uma delas, a mais criminosa, a mais absurda, a que mais ofende a simples razão, é aquela que, desde o princípio dos tempos e das civilizações, tem mandado matar em nome de Deus”.(José Saramago - O Fator Deus, 2001)
A intolerância religiosa é uma doença que de tempos em tempos torna-se epidêmica e precisa de tratamento continuado e prevenção. É um mal social, cuja cura passa pelo cumprimento da lei e pela educação. Um mal que atinge uma camada imensa da população global, que fere a dignidade humana, e a liberdade consciencial, que se baseia no preconceito, na discriminação e na pretensão de alguns em serem “os donos da Verdade”, que se sentem possuidores de alguma “procuração de Deus” para em seu nome, achincalhar, invadir, prender, torturar, matar, espoliar, e por fim,exterminar o outro.
E o outro é aquele a quem não se dá o direito de ter pensamento próprio, aquele a quem não se dá a liberdade de ser quem é, aquele que o intolerante julga intelectual e moralmente incapaz de fazer uma escolha “certa”. Porque qualquer escolha que não seja a sua - do intolerante- é errada.
Para se tentar acabar com a intolerância, é imprescindível tratá-la como doença, cujos remédios são a detecção e denúncia de sua existência, a exigência do cumprimento da Lei e, para prevenir sua recidiva e evitar o surgimento de novos casos; a execução uma ação intensiva e continuada de conscientização e educação plena de idosos, adultos, adolescentes e crianças; uma educação para a tolerância, para a compreensão, para a alteridade e o respeito. Num processo que envolva o comprometimento de toda a sociedade.
As justificativas dadas pelos intolerantes, principalmente pelos intolerantes religiosos vão desde a necessidade do cumprimento das “Leis de Deus” interpretadas e manipuladas a seu bel prazer, por interesses bem humanos e pouco religiosos - que no caso do Brasil desrespeitam a Constituição Federal – às questões de “segurança nacional” como ocorreu na América do Norte em relação ao Iraque.
A história nos mostra que a discriminação e a intolerância religiosa, foram e são responsáveis por guerras, fratricídios, genocídios, holocaustos, por divisões entre famílias e ódios milenares que são repassados e cultivados geração a geração por séculos, até que se percam da memória os reais motivos por que começaram. São frutos da manipulação política, social, econômica e ideológica. Criadas por mentes que anseiam pelo poder e a riqueza, tentam usurpar do Homem o direito e a capacidade de autogestão espiritual, de pensar e agir conforme suas próprias convicções, de avaliar por si mesmo o mundo em que vive.
A intolerância religiosa nasce da “fé cega” e não raciocinada de muitos dirigida pela astúcia de uns poucos que se aproveitam dos fiéis para obter poder, riqueza e vingança. Vingança quanto àquilo que não encontram em si mesmos, resultante da inveja, do ressentimento e da incapacidade de ser verdadeiro, original, de encarar de frente a luta para se ver livres de suas fraquezas, de agir com liberdade, de ser feliz . Nasce do desejo de destruir no outro aquilo que mais se admira, porém não se tem força, determinação, ousadia ou poder para ser.
A intolerância nasce da mesquinhez humana, do medo de ser, de fazer-se Ser, de ousar, de arriscar o novo, de pensar, questionar e refletir sobre o que já está estabelecido. Nasce da aceitação rancorosa das regras e dogmas contra os quais não se tem coragem de lutar, levantar a voz ou a dúvida.
Busque-se o intolerante e encontrar-se-á uma mente fechada, um espírito enrijecido, ressentido, engessado por sua própria deturpação da realidade. E que por isso mesmo precisa manipular o mundo à sua volta de modo a sentir-se seguro; convencendo esse mesmo mundo da necessidade de fechar-se em dogmatismos, fundamentalismos e fanatismos. Levando o fiel a um não-pensar, condicionando-o a um pensamento único e repetitivo, ao jugo de uma mentalidade tão estreita que dela não possa libertar-se e ao convencimento de que assim terá uma parte desse poder para si.
É certo que as massas se inflamam e se deixam levar por um bom orador. Não faltam exemplos na história. Sabemos que a repetição de uma inverdade não faz com que ela se torne “a Verdade” porém, pode levar muitos a crer que assim o seja.
Se o gérmen do fanatismo é individual, talvez presente de forma latente no Homem, se ele pode ser despertado e cultivado através do convencimento, da incitação, da repetição e do incutir continuado da idéia de estar cumprindo uma “missão sagrada”, um “designo divino” que pode livrar o homem do inferno e levá-lo ao paraíso; por outro lado há no ser humano toda uma generosidade, uma capacidade de empatia e de compreensão, de amor e fraternidade que precisa ser trabalhada quotidianamente em prol do bem comum, do cumprimento da lei, da tolerância religiosa e da liberdade.
Para se tentar acabar com a intolerância faz-se necessária uma ação de conscientização e educação plena de anciãos, adultos, adolescentes e crianças. Uma educação para a tolerância, para a compreensão, a alteridade e o respeito. Num processo que envolva o comprometimento de toda a sociedade. Idéia muito bem explicitada por Nelson Mandela:
“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender; e, se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar.”
Fonte: http://cafehistoria.ning.com/profiles/blogs/1980410:BlogPost:57996